Tronchas de Natal
Fernando Ramada, agricultor de Mondim-de Basto. Photo by Luís Neves
Chegámos estava a feira a terminar. Fernando Ramada levava as hortícolas que não vendera para a carrinha, de volta a casa. Duas ou três couves, alguns quilos de laranja. Combinava com uma cliente habitual a entrega das batatas e outros produtos. “Belas couves”, atirámos para o ar, metendo conversa. A senhora que finalizava a compra gabou os vegetais, aguçando-nos o apetite. “São tronchas para o Natal”, referiu Fernando, continuando a tarefa de levantar a banca. “Tronchas é como chamamos aqui”, explicou percebendo o nosso ar de ignorância. “Aguentam até ao Natal?”, quisemos saber.
A poucos minutos do almoço, praticamente todos os vendedores já tinham saído do mercado quinzenal de Mondim de Basto. Esta feira tradicional realiza-se nas primeiras e terceiras quintas-feiras de cada mês e aproxima produtores locais dos consumidores, ajudando a promover a economia local.
“Aguentam, pois”, informou-nos. Como tínhamos mais uma noite no Água Hotels de Mondim de Basto, sugeriu-nos que no dia seguinte passássemos na horta para levar umas tronchas acabadas de colher.
Aceitámos e na manhã da partida, tendo como ponto de referência o parque de campismo da terra, seguimos as coordenadas por entre caminhos estreitos de muros, casas e hortas.
Fernando viu-nos chegar com a alegria de quem vê voltar a casa família e amigos depois de uma longa ausência. No meio de carvalhos, avistando um espigueiro e ao som do rio que passa mais abaixo, ali cultiva-se de tudo. Trouxemos tronchas para o Natal e laranjas apanhadas ao amanhecer.
A poucos dias da consoada, já temos as tronchas à espera de serem cozidas. Carnudas e de tom verde sadio, produzidas nas terras de basto por um agricultor local, vão acompanhar o bacalhau cozido na ceia em Monte Real.
Os anos passaram, quase todos partiram e o Natal é um dia como outro qualquer. Mas há bacalhau e couves, como sempre houve. A usual acesa discussão sobre se as couves estavam melhores agora ou no ano anterior há muito que é só uma lembrança que nos faz sorrir.
Este Natal há, por isso, uma inesperada novidade. Por circunstâncias laborais, as couves vieram de Mondim e são tronchas. Temos mais uma história para acrescentar ao rol dos episódios das ceias natalícias. A partir de agora, nos próximos natais, alguém dirá: “As couves são tenras, mas boas boas eram as tronchas do Fernando, cultivadas nas terras de basto”.
Nota: enquanto Fernando trata da horta, com os pés bem assentes no chão, o seu filho paira nos céus de Mondim de parapente. O Clube Parapente de Basto salta a partir da Senhora da Graça e faz batismos de voo.