O petisco favorito de Amália 

Cozinha da Casa-Museu de Amália em Lisboa. Foto de Luís Neves

Diz-me o que comes, dir-te-ei quem és!

No caso de Amália, dada a relação que tinha com a gastronomia, era uma portuguesa de gema, com certeza. Pão e queijo sobre a mesa, já que vinho não apreciava.

Amália Rodrigues é a mais conhecida personalidade da Cultura portuguesa do século XX. Nascida em Lisboa (1920) de uma família humilde da beira baixa, quanto mais  anos passam do seu desaparecimento (1999) mais nítida se torna a importância do seu legado. Musical, mas não só. 

Inventou (com Alain Oulman e outros músicos de excepção) aquilo a que hoje chamamos Fado, um género musical com trinados de guitarra portuguesa e palavras de poetas de primeira água. Ultrapassou as barreiras do Fado e cantou outras músicas do mundo, sempre partindo da memória auditiva dos “melismas” (várias notas na mesma sílaba) característicos  do folclore da beira baixa, provando ter uma voz única de qualidade universal. Das melhores e mais versáteis do século XX. 

Cantou no mundo inteiro, de Tóquio a Sidnei, de Joanesburgo a Moscovo, de Telavive a Nova Iorque. Conquistou o Brasil, França e Itália, levando para cima do palco emoção e autenticidade. Portugal. 

Entretanto, o Fado consolidou-se como canção nacional e conquistou estatuto de património imaterial da UNESCO. Amália ganhou o Olimpo e é vista como um símbolo da identidade do ser português.

Foi uma mulher de vanguarda, na forma como ditou modas e quebrou preconceitos, sem ruptura. É, no século XXI, um ícone POP e um exemplo para as novas gerações. 

A sua personalidade multifacetada é estimulante e muito há ainda para trazer à luz do dia. Pensar Amália tem sido cada vez mais um desafio para investigadores, músicos, poetas, sociólogos, jornalistas.

Apesar do sucesso além fronteiras, voltava sempre para a casa da Rua de São Bento (hoje Casa Museu Amália Rodrigues), o seu mundo. Adorava sopa com legumes da horta do Brejão (a herdade no litoral alentejano onde descansava), pastéis de bacalhau (a que juntava uma posta de pescada para disfarçar os fios), guisado de borrego, sardinhas assadas, arroz de grelos, favas guisadas, …

As sessões de gravação no Estúdio da Valentim de Carvalho ficaram famosas pelos jaquinzinhos com arroz de tomate e outras iguarias que Amália levava de casa para  tornar as noites de trabalho mais calorosas.

O seu petisco favorito? Enguias jovens (angulas como também são conhecidas) trazidas do restaurante Gambrinus e cozinhadas em casa num tacho de barro. 

Amália, uma mulher universal, na hora da comida era (mesmo) portuguesa.

Sugestão de leitura

Amália. Palmas como pão para a boca. Receitas e outras histórias, de Flávio Furtado.

Sugestão musical:

Caldeirada poluição (Alberto Janes) e Hortelã mourisca (letra de José Vicente Rodrigues de Oliveira e música de Arlindo Duarte de Carvalho)

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